A licença concedida pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) para a perfuração na bacia da Foz do Amazonas prevê que uma nova modelagem de dispersão de petróleo no oceano, que simula o vazamento em caso de acidentes, seja feita a cada ano.
Ambientalistas criticam que uma nova versão não tenha sido entregue antes da autorização dada para a pesquisa no chamado bloco 59, concedida nesta segunda (20).
A autorização emitida à Petrobras determina que a empresa apresente um relatório anual com “uma nova modelagem de dispersão de óleo utilizando a nova base hidrodinâmica elaborada para a margem equatorial”.
A exigência é uma das 34 condicionantes para a atividade da petroleira no poço localizado a 175 km da costa do Amapá.
“O Ibama está permitindo testes, que já trazem um impacto à região, com a condição de que uma nova modelagem seja feita. Ou seja, essa modelagem não serve, deveria ser refeita antes de autorizar a licença”, diz Nicole Oliveira, diretora-executiva do Instituto Internacional Arayara.
Suely Araújo, coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima, afirma que as análises não tiveram a robustez necessária.
“Na etapa atual, a questão do acidente na perfuração é o principal problema a ser avaliado. Se eles mesmos reconhecem a necessidade de uma nova modelagem, não poderiam ter liberado a licença”, declara Araújo, que também presidiu o Ibama de 2016 a 2018.
Em nota, o Ibama afirma que as modelagens foram validadas e que a condicionante se refere a uma atualização: “Tal solicitação visa avaliar a aderência dos resultados decorrentes da utilização das novas bases aos já aprovados durante o licenciamento”.
Nicole Oliveira afirma que o órgão ambiental focou o processo de autorização no centro de fauna atingida por um eventual vazamento de óleo e colocou a modelagem em segundo plano.
“É uma região em que as correntes marítimas são totalmente diferentes de outros locais no litoral brasileiro. O nível do mar eleva 7 metros, 17 metros, em um período de horas ou semanas. Todas as características oceânicas e do próprio sistema recifal são muito únicas e sensíveis para se explorar sem os estudos adequados”, diz.
O Ibama declara que o licenciamento envolveu todos os passos exigidos, e o Ministério do Meio Ambiente diz que a autorização “resulta de um rigoroso processo de análise ambiental”.
Daniela Jerez, advogada do Greenpeace Brasil, afirma que a modelagem é essencial para avaliar o plano de emergência da Petrobras.
“Existe uma enorme incoerência técnica na aprovação da atividade de perfuração do bloco 59, demandando que após o seu início se apresente uma nova modelagem usando uma base hidrodinâmica que hoje já está concluída”, diz.
Petrobras avisa que começou a perfuração na Foz do Amazonas no mesmo dia de autorização
JOÃO GABRIEL, BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A Petrobras começou a perfuração do bloco 59 da bacia de petróleo de Foz do Amazonas no mesmo dia em que o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) emitiu a licença para a operação.
A informação consta em um ofício enviado pela petroleira ao órgão nesta terça-feira (21), ao qual a Folha de S.Paulo teve acesso, e também foi confirmada à CNN Brasil pela própria empresa.
No documento, a Petrobras diz que “a perfuração do poço exploratório […] teve início em 20/10/2025”, com referência à última segunda-feira. Não foi informado o horário de início da operação.
Esse foi o mesmo dia em que foi publicada a Licença de Operação para a empresa realizar a pesquisa por petróleo no local. A assinatura do presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, aconteceu às 12h14, no horário de Brasília, segundo consta no sistema.
Procurados para explicar como a perfuração começou tão rapidamente, nem a petroleira nem o órgão ambiental responderam.
Como mostrou a Folha de S.Paulo, o parecer técnico do Ibama cita riscos a peixes-boi ameaçados de extinção e lembra que a AGU (Advocacia-Geral da União) permitiu que o processo de licenciamento ignorasse os impactos a povos indígenas.
O documento cita não haver óbices ao empreendimento, desde que respeitadas 34 condicionantes (dentre elas, planos de proteção à fauna, à flora e de resposta a emergências). Também são exigidos R$ 39,6 milhões em compensações ambientais.
Durante o processo de licenciamento, um dos principais entraves foi a capacidade da Petrobras de responder devidamente a vazamentos e outros possíveis problemas.
No parecer técnico final, o Ibama destaca que o principal barco de apoio a emergências, que ficará no Pará, poderia demorar 55 horas para chegar ao local, mas que uma unidade mais rápida destacada pela empresa poderá fazer um primeiro atendimento em 26 horas.


