Brasil - Brasília - Distrito Federal - 27 de outubro de 2025
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Calor extremo no trabalho exige ação imediata, alertam especialistas

Seminário discute impactos das mudanças climáticas na saúde e segurança dos trabalhadores e defende adaptação dos ambientes laborais

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O impacto das mudanças climáticas na saúde e na segurança dos trabalhadores foi o tema central do painel “Proteção Social, Estresse Térmico e Saúde e Segurança do Trabalho”, realizado nesta quarta-feira (8), durante o Seminário Pré-COP 30: Promovendo Trabalho Decente e Transição Justa, em Brasília.

Promovido pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), o evento reuniu representantes do governo, do setor produtivo, trabalhadores e especialistas para debater medidas concretas de enfrentamento aos riscos do calor extremo e estratégias de fortalecimento da proteção social no contexto da transição climática.

Na abertura, Alexandre Furtado Scarpelli Ferreira, diretor do Departamento de Segurança e Saúde no Trabalho do MTE e moderador do painel, ressaltou que o tema vai além da esfera técnica, pois impacta diretamente a vida de milhões de trabalhadores e trabalhadoras. “Estamos falando de pessoas”, afirmou.

Ele destacou que é no trabalho que se constroem trajetórias e experiências, defendendo que a proteção social funcione como uma “rede viva”, capaz de acolher, garantir direitos e preservar a dignidade frente aos novos riscos impostos pelas mudanças climáticas.

Com base na apresentação de Daniel Bittencourt, pesquisador da Fundacentro e coordenador do Programa de Mudança Climática e Segurança e Saúde no Trabalho, o painel destacou que o estresse térmico se configura hoje como um dos maiores desafios impostos pelas mudanças climáticas ao mundo do trabalho.

Segundo ele, cerca de 32,5 milhões de trabalhadores atuam a céu aberto em setores como agricultura, construção civil e pesca — muitos em condições de informalidade e, por isso, mais vulneráveis. Bittencourt alertou que, em regiões como Norte, Nordeste e Centro-Oeste, os índices de calor ultrapassam os limites de tolerância em mais de 70% da jornada de trabalho, especialmente em atividades pesadas. “Mesmo que as emissões sejam reduzidas, a inércia climática já garante que as temperaturas e as ondas de calor se mantenham elevadas por muitos anos”, afirmou.

O pesquisador reforçou que a adaptação dos ambientes de trabalho é uma medida urgente, envolvendo o uso de tecnologias acessíveis — como o monitoramento pelo IBUTG (Índice de Bulbo Úmido Termômetro de Globo) —, a previsão de ondas de calor, a readequação de jornadas, pausas regulares e a capacitação de trabalhadores e empregadores para identificar sinais de exaustão térmica. Segundo ele, essas ações são fundamentais tanto para preservar vidas quanto para garantir a produtividade.

Joaquim Pintado Nunes, diretor do Departamento de Saúde e Segurança no Trabalho da OIT, ressaltou a importância de incluir a exposição ao calor nas estratégias globais de prevenção de acidentes e doenças ocupacionais. Ele defendeu uma abordagem multissetorial, que envolva reformas legislativas, políticas públicas e suporte técnico, sempre adaptadas às especificidades de cada setor produtivo.

Nunes destacou que medidas preventivas simples — como reorganização de horários, pausas regulares, uso adequado de EPIs e climatização dos ambientes — são viáveis e proporcionam benefícios diretos à saúde dos trabalhadores e à produtividade das empresas, reforçando a interdependência entre segurança no trabalho, saúde pública e políticas ambientais.

Representando o setor empresarial, Frederico Toledo Melo, gerente de Relações do Trabalho e Sindicais da Confederação Nacional do Transporte (CNT), enfatizou a urgência de enfrentar os impactos climáticos sobre os trabalhadores, especialmente aqueles expostos ao calor extremo. Ele alertou que a simples compensação financeira, por meio de adicionais de insalubridade, não substitui a prevenção nem a adaptação tecnológica.

Membro da Comissão Tripartite Paritária Permanente (CTPP), Frederico destacou o papel estratégico do fórum na discussão das Normas Regulamentadoras (NRs) e defendeu o fortalecimento do diálogo social e de políticas que integrem inovação, qualificação profissional e proteção das regiões mais vulneráveis.

Encerrando o painel, o professor e pesquisador René Mendes, do Observatório do Trabalho da USP, alertou que o estresse térmico não é um fenômeno isolado, mas sim resultado de uma “combinação perversa” entre as mudanças climáticas e modelos de gestão do trabalho eticamente inaceitáveis.

Com mais de 50 anos de experiência na área, Mendes denunciou a intensificação de metas, o assédio e o pagamento por produtividade como fatores que aumentam os riscos do calor, especialmente entre trabalhadores informais e imigrantes.

Ele destacou que, embora as normas de segurança sejam fundamentais, elas são insuficientes sem investimentos estruturais, sobretudo em transporte público e infraestrutura, que classificou como “a via mestra da economia” em um país de dimensões continentais. Para Mendes, a efetividade das políticas de trabalho decente e de enfrentamento às mudanças climáticas depende de um Estado atuante e de um diálogo contínuo entre capital, trabalho e governo.

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